terça-feira, 31 de janeiro de 2012

http://missaobioma.g1.globo.com/

JOGO SOBRE BIOMA !!!

Risco de pesquisa com vírus mortal é alto demais, diz agência dos EUA

Cientistas do NSABB são contra publicação de estudo sobre gripe aviária.
Pesquisa se tornou polêmica porque pode ser usada por bioterroristas.

Do G1, em São Paulo
1 comentário
Pesquisadores do Painel Consultivo sobre Biossegurança dos Estados Unidos (NSABB, na sigla em inglês) publicaram nesta terça-feira (31) um artigo nas revistas “Science” e “Nature”, no qual se posicionam mais uma vez contra a publicação dos detalhes de uma pesquisa com o vírus H5N1, da gripe aviária, que tem alta taxa de mortalidade entre humanos.
A equipe de Ron Fouchier, do centro médico Erasmus, da Holanda, estuda a transmissão do H5N1 entre mamíferos – inclusive de pessoa para pessoa. O NSABB teme que o conhecimento possa ser usado por bioterroristas para espalhar o vírus mortal.
No momento, a pesquisa está suspensa temporariamente, por iniciativa dos próprios autores. Em um artigo anterior, eles defenderam a publicação dos resultados, alegando que os benefícios desse estudo superam os riscos.
O NSABB reconhece, no artigo, os “claros benefícios” da pesquisa de Fouchier, que deixa os médicos mais preparados para combater a gripe aviária. Ainda assim, acham que não compensa publicar os resultados.
Nós consideramos que o risco potencial é de uma magnitude extraordinariamente alta"
Painel Consultivo sobre Biossegurança dos Estados Unidos
“Nós consideramos que o risco potencial é de uma magnitude extraordinariamente alta”, diz o texto, assinado por 22 especialistas de diferentes universidades norte-americanas.
“É uma recomendação sem precedentes para o trabalho nas ciências biológicas, e nossa análise foi conduzida com consideração cautelosa tanto dos benefícios da publicação quanto da potencial ameaça que poderia ocorrer a partir desse precedente”, afirma.
Ainda segundo o artigo, esse é um momento decisivo para a ciência e a opinião de toda a sociedade é válida. “Físicos enfrentaram uma situação similar na década de 1940 com a pesquisa com armas nucleares, e é inevitável que outras disciplinas científicas também enfrentem”, comparam os cientistas.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O evangelista evolucionário

Em sua coluna de novembro, Sergio Pena comenta o último livro do biólogo e divulgador britânico Richard Dawkins e elogia sua defesa da evolução como fato, e não como teoria.

O evangelista evolucionário
Richard Dawkins, evangelista evolucionário, grande defensor e divulgador do fato da evolução (foto: Christopher G Street).
Neste ano que em que se comemoram 200 anos do nascimento de Charles Darwin (1809-1882) e 150 anos da publicação da Origem das espécies, é muito fácil cair na tentação de fazer um culto à personalidade. De fato, já discuti em uma coluna anterior o fato de que a narrativa da vida de Darwin que se tornou padrão na imprensa e na literatura popular é suspeitosamente similar à descrição da “trajetória do herói” popularizada pelo mitologista americano Joseph Campbell.
Culto à personalidade
O culto da personalidade, uma característica dos regimes totalitários, não deveria ter nenhum lugar em ciência (reprodução).
Sob esse prisma é interessante examinar a relação que há entre os escritos de Charles Darwin, na Origem e em seus livros posteriores,  e a evolução tal como ela é concebida pela genética moderna. Nos últimos 150 anos, a seleção natural foi primeiro extensivamente modificada (e fortalecida) pela compatibilização com a genética mendeliana, na chamada Nova Síntese. Mais recentemente, foi enriquecida pelos avanços da genômica, passando a incluir a evolução neutralista por deriva genética como parte fundamental de seu cânone.
Metaforicamente, podemos comparar a evolução por seleção natural apresentada por Darwin a um avião equivalente ao 14-Bis de Santos Dumont (1873-1932), enquanto a evolução como conceituada hoje, lastreada em estudos diretos do DNA, seria um supersônico Concorde ou, melhor ainda, um bombardeiro Stealth.
A visão moderna da evolução descende de Darwin, mas com considerável modificação
É possível dizer que a visão moderna do processo evolucionário descende de Darwin, mas com considerável modificação. Ele não pode de forma alguma ser visto como a personificação da evolução, como ocasionalmente é retratado na imprensa.
Não chamamos a teoria da relatividade de “einsteinianismo”. Da mesma maneira, sugiro que a expressão “darwinismo”, muito usada e abusada por evolucionistas e especialmente por criacionistas, seja empregada exclusivamente para se referir ao que ele escreveu e abandonada de uma vez por todas como representação do todo da evolução.
Richard Dawkins
A evolução por seleção natural teve vários defensores e divulgadores nos últimos 150 anos. O primeiro foi Thomas Huxley (1825-1895), fundamental na propagação das idéias de Darwin, incapacitado de viajar e apregoar sua própria teoria por causa da doença que o aprisionava em sua residência rural em Kent, na Inglaterra. Por isso, Huxley recebeu o apelido de “Buldogue de Darwin”. Outro grande paladino da seleção natural no continente europeu foi o controverso Ernst Haeckel (1834-1919), ocasionalmente chamado, por analogia e origem natal, de “Dobermann de Darwin”.
Pois bem, a atual grande face pública da evolução natural é certamente o britânico Richard Dawkins (1941-). Tenho algumas restrições a Dawkins, principalmente pela sua posição ultrasselecionista. Mas é mister reconhecer o valor e a importância dessa grande figura humana. De fato, Dawkins e eu temos muito em comum: somos ambos racionalistas militantes e evolucionistas “roxos” (independentemente, nós dois sempre falamos sobre “o fato” da evolução).
A atual grande face pública da evolução natural é o britânico Richard Dawkins
No mês passado, em Nova Iorque, assisti a uma palestra de Dawkins, como parte da campanha de lançamento de seu novo livro The Greatest Show on Earth (“O maior espetáculo da Terra” – ver abaixo). Foi uma surpresa observar que o local – a Associação Hebraica (92Y), na esquina da rua 92 com a avenida Lexington – estava superprotegido pela polícia, presumivelmente para evitar qualquer tentativa de terrorismo. O quarteirão havia sido fechado ao tráfego e havia detectores de metal na entrada do auditório.
Capa - The greatest show on Earth
O novo livro de Richard Dawkins, “O maior espetáculo da Terra”, lançado há menos de um mês, já ocupa o 17º lugar na lista de best-sellers não-ficção do jornal 'The New York Times'.
Dawkins tem uma aparência patrícia, com traços finos, personalidade suave (mas podendo em segundos se tornar duro como aço) e um sotaque inglês muito bonito, exalando cultura. Sem dúvida uma bela estampa. Com o auditório totalmente lotado, assistimos a um verdadeiro show de retórica, com explicações cristalinas e exemplos cativantes sobre a evolução.
No dia seguinte, Dawkins deu outra palestra, na Academia de Ciências de Nova York, que inclusive está disponível em um podcast, no qual ele é apresentado como “evangelista da evolução” e chamado de “Rottweiler de Darwin”. Na fala – que recomendo –, ele descreve, capítulo a capítulo, as ideias centrais do seu novo livro.
O maior espetáculo da Terra
A nova obra de Dawkins hoje ocupa o 17º lugar na lista de best-sellers não-ficção do New York Times (uma lista que raramente contém livros científicos). Em um golpe de marketing, escolheu o título “O maior espetáculo da Terra”, o mesmo usado para descrever o famoso circo de P.T. Barnum (1810-1891). Mais tarde, o título foi também usado no filme de 1952 dirigido por Cecil B. DeMille.
Entretanto, não é tudo papel machê: o texto é rigorosamente científico, informativo, convincente e muito bem escrito. Em outras palavras, motivo de admiração e inveja “positiva” deste colunista. Não vou descrever o seu conteúdo, que tem recebido dezenas de resenhas apreciativas, incluindo uma, em português, do jornalista Claudio Angelo na Folha de S. Paulo.
O novo livro de Dawkins é rigorosamente científico, informativo, convincente e muito bem escrito
Entre as resenhas que vi, a mais peculiar foi a de Nicholas Wade, editor de ciências do New York Times. Wade decidiu implicar com o autor, embarcando em uma discussão epistemológica estéril sobre exatamente o ponto que eu mais concordo com Dawkins: a visão de que a evolução é um fato e não uma mera teoria.
A resenha de Wade catalisou  uma carta ao editor que transcrevo aqui, pois é brilhante e resume pontos de grande importância.
A carta é do conhecido filósofo americano Philip Kitcher (1947-) , Professor da Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque. Ele escreve (minha tradução):
Na resenha do livro The Greatest Show on Earth, Nicholas Wade acusa Richard Dawkins de um erro filosófico. De acordo com Wade, os filósofos da ciência dividem proposições científicas em três tipos — fatos, leis e teorias — e, de forma contrária às afirmativas de Dawkins, a evolução, que é simplesmente uma teoria, não pode ser considerada um fato. Entretanto, a filosofia da ciência contemporânea oferece um vocabulário muito mais vasto e detalhado para o pensamento das ciências do que é pressuposto na taxonomia supersimplificada de Wade e seus confusos palpites sobre “verdade absoluta”. Embora filósofos possam discordar de aspectos dos argumentos de Dawkins em outros tópicos, ele tem uma compreensão mais firme e sutil do que sugere a resenha de Wade.
O ponto crucial é que, como Dawkins corretamente percebe, a distinção entre teoria e fato, em discussões filosóficas assim como coloquialmente, pode ser estabelecida de duas maneiras diferentes. Por um lado, teorias são concebidas como sistemas gerais de explicação e predição, enquanto fatos são relatos específicos sobre processos e eventos. Por outro lado, “teoria” é usada para sugerir que há espaço para dúvidas racionais, enquanto “fato” sugere algo que é tão amplamente confirmado pela evidência que pode ser aceito sem debate.
Os oponentes da evolução se deslocam da ideia de que a evolução é uma teoria, no primeiro sentido, para concluir que é (apenas) uma teoria, no segundo. Qualquer inferência desse tipo é falaciosa, pois muitos enfoques sistemáticos de fenômenos naturais – como a compreensão de reações químicas em termos de átomos e moléculas e o estudo da hereditariedade em termos de ácidos nucleicos – são tão bem alicerçados que contam como fatos (no segundo sentido). Muitos cientistas e filósofos que já escreveram sobre evolução têm indicado que a teoria contemporânea, que descende de Darwin, tem o mesmo status – ela também deve ser considerada um “fato”. Dawkins está plenamente justificado em segui-los.”
Assim, com palavras sábias e cristalinas, Kitcher, a meu ver, sacramenta irreversivelmente a evolução como fato.
E o New York Times dá uma demonstração de integridade jornalística ao publicar uma carta de crítica a um de seus editores, em contraste com algumas publicações brasileiras que só divulgam cartas elogiosas.

Sergio Danilo Pena
Departamento de Bioquímica e Imunologia
Universidade Federal de Minas Gerais

Evolução e religião

Colunista recorre à genômica comparada para apontar limitações e fragilidades do desenho inteligente

Evolução e religião
O painel superior mostra uma imagem de microscopia Nomarski de leveduras em cultura. O painel inferior mostra os experimentos de engenharia genética publicados por nós (clique na imagem para baixar o artigo). No lado esquerdo está mostrada uma colônia nor


A resistência de alguns grupos religiosos à evolução é um problema que me deixa simultaneamente perplexo e entristecido. Como racionalista de carteirinha e cientista militante, tenho dificuldade em entender essa situação. Como pode um indivíduo pensante desprezar evidências empíricas gritantes e concretas para adotar em seu lugar um pensamento anticientífico, com base apenas em revelações e escrituras milenares de origem obscura que alegam ser de autoria divina?

O que considero necessário não é a ciência da evolução se modificar com o objetivo de se tornar palatável para algumas crenças religiosas. O importante é que as religiões adaptem suas doutrinas para lidar com a realidade da evolução, assim como tiveram de se adaptar à teoria heliocêntrica do Sistema Solar 500 anos atrás.

É absolutamente incontestável o fato da evolução. Não se trata de uma simples teoria da evolução. Dados paleontológicos, geológicos e fisiológicos já forneceram ampla evidência da origem única da vida na Terra e de sua evolução progressiva para formar as milhões de espécies de animais e plantas que aqui habitam. Mas a genômica comparada foi a cereja no topo do sorvete, o elemento que nos deu a prova final da verdade incontestável da evolução.

Evolução comparada
Os dados gerados pelo Projeto Genoma em humanos e em outros organismos mostraram que a sequência de DNA do nosso genoma é 99% idêntica à do chimpanzé (!), além de ter em comum 65% com o camundongo (!!), 47% com a mosca de frutas Drosophila melanogaster (!!!), 20% com uma pequena mostarda chamada Arabidopsis thaliana (!!!!) e até 15% igual à da levedura Saccharomyces cerevisiae (!!!!!), que produz para nós o pão e a cerveja.

Esse alto grau de compartilhamento genômico mostra que toda a biosfera é, como nós, herdeira de um genoma primordial que deu origem ao primeiro ser vivo na Terra, a partir do qual todos os outros derivaram. Não somos o produto final e perfeito da criação, com direito divino de destruir nossos primos animais e plantas a nosso bel-prazer. Somos parte de uma rede de vida e, se esfacelarmos essa rede, destruiremos a nós próprios. A consciência do nosso parentesco genômico com os outros organismos terrestres, da origem única e da herança do DNA que une todos os seres vivos deve nos motivar para tratar o nosso planeta com renovado respeito.

Ademais, a similaridade genômica vai além do plano estrutural do DNA e se estende ao nível funcional. Por exemplo, há alguns anos um aluno do meu laboratório de pesquisa (Túlio M. Santos) desenvolveu sua tese de doutorado em torno de um gene chamado SmRho isolado do verme Schistosoma mansoni (o parasita causador da esquistossomose, doença que aflige centenas de milhões de pessoas em todo o Terceiro Mundo).

Para verificar se SmRho era funcionalmente o mesmo gene homólogo já anteriormente bem conhecido no Saccharomyces cerevisiae, usamos primeiramente técnicas de engenharia genética para deletá-los das leveduras – com isso, elas se tornaram incapazes de se dividir e de formar colônias (ver figura).

Então, transferimos para as leveduras doentes o gene SmRho do parasito. Eureca! As leveduras voltaram a crescer e a formar colônias quase normais. Em outras palavras, o gene Rho do verme funcionava perfeitamente na levedura, da qual estava separado evolucionariamente há centenas de milhões de anos.

Darwin e a religião
Como todos sabem, em 2009 comemoramos 200 anos do nascimento de Charles Darwin e 150 anos da publicação da Origem das espécies. De fato, nos últimos meses temos sido expostos pela imprensa a uma miríade de artigos sobre o grande cientista, a vasta maioria deles infelizmente contendo afirmações bombásticas e errôneas, escritas por pessoas que nunca leram Darwin e não entendem nada de genética evolucionária. Um dos pecados sensacionalistas mais comuns é afirmar que “Darwin matou Deus”. Besteira pura!

Para entendermos a relação de Darwin e da evolução com a religião, vamos fazer um desvio pela física, com uma história contada pelo astrofísico americano Neil de Grasse Tyson, do Museu Americano de História Natural de Nova Iorque em seu excelente artigo “O perímetro da ignorância” (The perimeter of ignorance), publicado em 2005 na revista Natural History.

A lei da gravidade, desenvolvida pelo genial Isaac Newton (1643-1727), permite que seja calculada a força de atração entre dois corpos celestes. Assim, é possível traçar as órbitas dos planetas em torno do Sol. Entretanto, os planetas também exercem forças de atração entre si. Até Plutão, que desde 2006 nem é mais considerado um planeta, exerce gravidade sobre a Terra. Isso cria uma rede de atrações mútuas que modifica as órbitas dos planetas e é extremamente difícil de computar.
Pierre-Simon de Laplace, em retrato pintado Madame Feytaud, parte da coleção da Academia de Ciências, Paris, França. Laplace expandiu o perímetro de ignorância que tolhia Newton, demonstrando que equações que continham as forças gravitacionais de todos os planetas demonstravam um sistema solar estável.
Pois bem: quando Newton tentou lidar com tudo isso em suas equações, chegou à conclusão de que o Sistema Solar era muito instável e que os planetas deveriam ter se precipitado sobre o Sol (o que obviamente não tinha acontecido). Ele então escreveu em 1687 nos Principia mathematica, sua obra mais importante: “Não é possível conceber que meras causas mecânicas possam gerar tantos movimentos regulares... Este maravilhoso sistema... só poderia operar sob o domínio de um Ser poderoso e inteligente”

As coisas ficaram assim por mais de um século até que, em 1825, Pierre-Simon de Laplace, na França, conseguir provar matematicamente a estabilidade do Sistema Solar em seu tratado em cinco volumes Mecânica celeste, que ofertou a Napoleão Bonaparte. Segundo a lenda, o imperador leu a obra (naquela época os líderes de países eram aparentemente cientificamente alfabetizados – bons tempos...) e perguntou a Laplace por que não havia nenhuma menção a Deus. A resposta de Laplace foi: “eu não tinha necessidade de tal hipótese”!

O mesmo se passou com Darwin. Em momento algum ele propôs que Deus não existia. Ele simplesmente não tinha necessidade daquela hipótese para explicar a origem dos seres vivos e a grande variedade de espécies no mundo natural. De fato, ele escreveu na Origem das espécies: “Existe um desenho aparente nos organismos vivos. Mas a seleção natural é suficiente para explicar isto. Não é necessária a hipótese da existência de um desenhista” (a propósito, o uso da palavra “desenhista” por Darwin remete-nos ao argumento de William Paley, que será apresentado mais à frente nesta coluna).

Evolução e religião
Assim, a evolução por seleção natural é perfeitamente compatível com a crença na existência de Deus.

Os evolucionistas estão preocupados em entender a geração da diversidade dos seres vivos na Terra e não têm qualquer desejo – ou tempo – para se intrometer em problemas espirituais. Parafraseando Galileu Galilei, podemos dizer que a preocupação de quem estuda a evolução é entender como as coisas andam na Terra e não entender como se ganha o céu...

Apenas algumas denominações protestantes fundamentalistas fazem uma interpretação literal estrita, criacionista, do livro do Gênesis na Bíblia que os leva a rejeitar em princípio a evolução biológica. Para eles a Terra (e todo o universo) tem menos de 10 mil anos (danem-se os dinossauros e toda a evidência fóssil) e Deus criou o homem diretamente!

No seu livro Os anais do velho testamento, publicado em 1650, o bispo inglês James Ussher calculou que Deus criou o universo na véspera do dia 23 de outubro de 4004 a.C. Até o final dos anos 1970 todas as Bíblias colocadas em quartos de hotel nos Estados Unidos pela Gideon Society continham essa estimativa, que também fez parte da arguição a que Clarence Darrow submeteu William Jennings Bryan no famoso julgamento de Scopes, no Tennessee, em 1926.

Esse julgamento foi importantíssimo na história do desenvolvimento do ensino de evolução em escolas públicas nos Estados Unidos. O excelente filme O vento será sua herança (1960), com Spencer Tracy, conta a estória do julgamento de forma ficcional.
 
Imagem do filme O vento será sua herança, versão ficcionalizada do julgamento de Scopes, no Tennessee, em 1926. Na cena, Clarence Darrow (Spencer Tracy) argui William Jennings Bryan (Fredric March) sobre o cálculo feito pelo bispo inglês James Ussher de que Deus criou o universo na véspera de 23 de outubro de 4004 a.C. Esse julgamento foi importantíssimo na história do desenvolvimento do ensino de evolução em escolas públicas nos Estados Unidos.

Desenho inteligente (?)
Em 1987 a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu que a necessidade do ensino do criacionismo ao lado da evolução nas escolas públicas era incompatível com a separação de Estado e Igreja. Assim, os fundamentalistas americanos tiveram de mudar a sua estratégia contra o ensino da evolução, tirando a ênfase do aspecto religioso e adotando uma argumentação “científica”: o chamado “desenho inteligente”.

Na verdade este argumento não tem nada de novo (nem científico), pois foi originalmente proposto pelo filósofo inglês William Paley (1743-1805). No seu livro Teologia natural, ele apresentou o seguinte argumento a favor da existência de Deus (tradução minha):
”[…] imagine que eu pise em uma pedra e que alguém me pergunte como ela foi parar naquele lugar; se eu responder que do meu ponto de vista ela sempre esteve naquele local, não seria possível demonstrar qualquer absurdo na minha resposta. Mas imaginem que eu encontre um relógio no chão e que me perguntem como ele foi parar lá. Eu não pensaria na mesma resposta. […] Deve ter havido, em algum tempo e lugar, um artífice ou artífices que fizeram o relógio [...], que entenderam seu uso e desenharam sua construção.”
A versão moderna do “desenho inteligente” argumenta que existem várias estruturas nos seres vivos que são irredutivelmente complexas, ou seja, compostas de elementos harmônicos e interativos que contribuem para o funcionamento do todo, de forma que a remoção de qualquer das partes faz com que ele cesse de funcionar.

Tais estruturas, eles argumentam, não poderiam evoluir naturalmente, pois a sua função só iria emergir quando o todo estivesse completo. Assim, como no caso do relógio de Paley, a existência desses órgãos implica na existência de um ser superior que os teria “desenhado”. Um dos exemplos favoritos é o do olho humano.

Não vou detalhar o conceito de exaptação, já mencionado nessa coluna anteriormente, ou argumentar que em princípio a evolução do olho humano é bem entendida, tendo seu início em agrupamento de células fotossensíveis que constituem olhos primitivos em organismos menos complexos.

Em vez disso, prefiro discutir um ponto ressaltado por Neil de Grasse Tyson, que é a enorme presunção, a incrível húbris de alguém afirmar que, “se eu não entendo como o olho humano foi formado pela evolução, isso quer dizer que ninguém mais, agora ou no futuro, será capaz de entender isto”.

A ciência não funciona dessa maneira. Sabemos que o nosso conhecimento científico atual é finito e circundado por um perímetro de ignorância. Quando, ao ponderar sobre um problema, esbarramos nesse perímetro, nós, cientistas, tentamos empurrá-lo, aumentá-lo, alargá-lo, e não simplesmente cruzar os braços e dizer que “eu não entendo aquilo, não sei como funciona, é complicado demais para qualquer humano entender, logo deve ser o produto de uma inteligência superior”.

Termino com um parágrafo de Tyson (minha tradução):  
“A ciência é uma filosofia de descoberta. O desenho inteligente é uma filosofia de ignorância. Não é possível construir um programa de descoberta baseado na premissa que ninguém é inteligente o suficiente para encontrar a resposta a um problema. Tempos atrás, as pessoas apontavam o deus Netuno como a fonte das tempestades no mar. Hoje, sabemos quando e onde elas começam. Sabemos o que as alimenta. Sabemos o que pode mitigar seu poder destrutivo. E qualquer pessoa que já estudou o aquecimento global pode contar o que as faz se agravarem. As únicas pessoas que ainda chamam furacões de ’atos de Deus‘ são as que escrevem as apólices das companhias de seguro.” 
 
Sergio Danilo Pena
Professor Titular do Departamento de Bioquímica e Imunologia
Universidade Federal de Minas Gerais
08/10/2009

Galera começo o ano de 2012 com novas atividades no blog , e falando da Origem da vida

Tem alguém aí?

Astrobiólogos estudam origem da vida na Terra para entender se ela pode existir em outros astros


Recentemente, a sonda Cassini, da Nasa, identificou evidências de que pode haver água líquida em Enceladus, uma lua de Saturno. A existência de água é uma condição fundamental para a existência de vida tal como a conhecemos na Terra (foto: Nasa).
A origem da vida e a existência de vida extraterrestre são alguns dos grandes enigmas não resolvidos da ciência. Questões como essas são estudadas por pesquisadores de diversas áreas – astrônomos, biólogos, geneticistas, químicos, físicos, geólogos e engenheiros – reunidos em uma disciplina própria: a astrobiologia. Em março, dezenas de especialistas nesse campo vindos de seis países estiveram no Rio de Janeiro para debater as novidades da área no primeiro Workshop Brasileiro de Astrobiologia. Entre os principais temas discutidos, estavam a existência de estrelas e planetas de interesse astrobiológico nas proximidades do Sol ou a sobrevivência de moléculas orgânicas no espaço.

Uma das estrelas do evento foi a bióloga norte-americana Janet Louise Siefert, da Universidade de Rice (EUA), especialista no estudo da evolução de biomoléculas, que proferiu uma conferência sobre a origem da vida.

Janet explica que, antes de nos indagarmos sobre a existência de vida extraterrestre, deveríamos refletir sobre a própria definição de vida. Na Terra, ela é formada a partir de átomos de carbono que, combinados com outros átomos, formam moléculas complexas, como o DNA. Mas seria possível a existência de outras formas de vida sem carbono? A bióloga afirma que não consegue imaginar outros elementos químicos capazes de atingir a complexidade de ligações químicas característica do carbono, que lhe confere maior diversidade e capacidade de mutação e evolução.

Mas ela própria não descarta a idéia. “Se formos a Marte e descobrirmos vida extraterrestre feita de carbono, proteínas e DNA, conseguiremos reconhecê-la. Mas e se existir outra forma de vida? Poderíamos ao menos identificá-la?”

A bactéria Bacillus subtilis sobrevive até seis anos no vácuo e frio do espaço. O estudo de micróbios capazes de tolerar condições extremas é de grande interesse para a astrobiologia (foto: Nasa).
Uma pista importante é a existência de água: na Terra, ela é usada como principal solvente, fundamental para as reações bioquímicas. A existência desse líquido em outros astros é vista com grande esperança pelos astrobiólogos: a descoberta de que ela existe ou existiu sob alguma forma em Marte, Europa (uma lua de Júpiter) ou Enceladus (uma lua de Saturno) impulsionaram recentemente o debate sobre o tema.

Outra pista para o entendimento da vida é o estudo de microrganismos que vivem em condições extremas de temperatura, pressão e pH, em lugares com pouca fonte de nutrientes ou até dentro de rochas. Esses organismos até poderiam sobreviver em ambientes como o de alguns planetas ou satélites conhecidos – resta saber se esses ambientes seriam capazes de originar vida, além de abrigá-la.

Esforços científicos
Para estudar a origem da vida, os astrobiólogos promovem experimentos de laboratório na busca de entender a origem e evolução de biomoléculas funcionais e dos sistemas celulares e procuram por fontes de energia que poderiam ter sido utilizadas pelas formas primitivas de vida, como as reações de oxidação e redução ou captação de energia solar. Os especialistas identificam também a natureza de compostos orgânicos dos meteoritos e amostras de asteróides e promovem simulações para interpretar o espectro das nuvens interestelares.

“Estudar como a vida se formou na Terra pode nos levar a entender se existe vida extraterrestre ou nos guiar para o caminho errado, mas atualmente é tudo o que podemos fazer”, afirmou Janet Siefert em entrevista à CH On-line .

Uma das hipóteses para o surgimento da vida – a chamada panspermia – postula que a vida terrestre seria originária do espaço. Essa teoria foi criada pelo filósofo grego pré-socrático Anaxágoras (500 a.C.-428 a.C.) e reformulada pelo médico e físico alemão Hermann Von Helmholtz (1821-1894) em 1879.

Radiotelescópios do projeto Seti instalados no México para captar possíveis sinais de rádio emitidos por civilizações extraterrestres (foto: Seti-Mexico).
Recentemente, o astrônomo William Napier, do Observatório Armagh, na Irlanda do Norte, propôs o contrário: a hipótese de que a própria Terra teria disseminado bactérias primitivas no espaço, lançadas com pedregulhos formados por impactos de meteoros. Em artigo publicado em 2004 na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society , ele conclui que os microrganismos seriam capazes de resistir ao impacto do meteoro, mas, para sobreviverem à radiação presente no espaço, essas rochas teriam que sair rapidamente do Sistema Solar, cercadas por nuvens moleculares densas, e pousar em outro astro que suporte a vida.

Enquanto isso, o projeto Seti (sigla em inglês para "busca por inteligência extraterrestre") ainda procura captar, através de ondas de rádio, sinais de vida inteligente no espaço. Desde 1960, quando o astrofísico americano Frank Drake realizou os primeiros esforços fracassados de "escuta", ainda não foi detectado nenhum sinal. Mas quem sabe um dia possamos responder a todas essas perguntas com um contato imediato de segundo grau.

Apocalipse adiado

Planetário estreia produção própria que explica o calendário maia e mostra como poderia ser realmente o fim do mundo.

Apocalipse adiado
Novo filme do Planetário do Rio mostra que o calendário maia foi mal interpretado e que o mundo não está com os dias contados – embora o seu fim possa chegar a qualquer momento, com a queda de um meteoro ou outros eventos cósmicos. (imagem: Divulgação)
A literatura e o cinema popularizaram as previsões de fim do mundo há bastante tempo. O apocalipse da vez é o supostamente anunciado pelo calendário maia, encontrado na década de 1960 e segundo o qual, no próximo dia 21 de dezembro, uma catástrofe natural exterminaria a raça humana e, junto com ela, tudo mais que existe no planeta.
O mote – e a grande repercussão que vem tendo na internet – inspirou astrônomos da Fundação Planetário do Rio de Janeiro, que acaba de lançar o filme Fim do mundo. “Sabíamos que esse tema estaria na mídia este ano e acompanhamos o que se falava nas redes sociais”, conta Alexandre Cherman, astrônomo do planetário e um dos produtores do filme. “Usamos uma abordagem científica para mostrar às pessoas que isso não vai acontecer agora”, completa.
“Usamos uma abordagem científica para mostrar às pessoas que isso não vai acontecer agora”
Fim do mundo pretende provar que a profecia é um grande erro de interpretação. Para isso, explica o que é um calendário, como os maias lidavam com o tempo, suas medidas e divisões em ciclos – b’ak’tun, o ciclo mais longo, seria o responsável pelo anúncio do apocalipse. Segundo especialistas, o que está representado na pedra em que o calendário foi escrito nada mais é do que o fim de uma era e o início de outra. Algo como nosso réveillon.
Para Cherman, e para a maioria dos cientistas, o mundo vai, sim, acabar, mas isso acontecerá daqui a milhões ou bilhões de anos. De acordo com o conhecimento científico atual, não existe uma razão sensata para acreditar que isso ocorrerá agora. O problema maior é que muitas pessoas confundem o fim do planeta com o desaparecimento dos seres humanos – este, sim, pode acontecer a qualquer momento, como resultado, por exemplo, de guerras nucleares ou do espalhamento das superbactérias.
O filme explica também como os dinossauros e seus contemporâneos foram dizimados, ressaltando o fato de que nosso planeta é vulnerável a acidentes como aquele e que, de certo modo, está fadado ao fim. Seja pela queda de um meteoro – como no caso dos dinossauros –, pelo apagar do Sol ou algum outro evento cósmico.

Produção nacional

Fim do mundo, em exibição na cúpula Carl Sagan do planetário, foi inteiramente produzido pelos profissionais da instituição e levou pouco mais de quatro meses para ficar pronto. “A produção foi bastante enxuta; iniciamos a elaboração do roteiro em setembro e já estreamos agora em janeiro”, comenta o astrônomo.
Segundo Cherman, a cúpula Galileu Galilei é a única que não tem material produzido nacionalmente. “Adquirimos há pouco tempo um novo sistema de tecnologia digital, mas que só usamos para exibir produções internacionais, já que ainda não existe no Brasil tecnologia para isso. Esperamos tê-la o mais rápido possível.”